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Estado

Ministério Público denuncia 48 pessoas ligadas à adulteração de leite

Publicado em 05/09/2014 ás09:00

MPRS/Divulgação

Foto: MPRS/Divulgação

O Ministério Público de Santa Catarina (MPSC) apresentou denúncia contra 48 pessoas ligadas às empresas Laticínios Lajeado, nos municípios de Lajeado Grande (matriz) e Ponte Serrada (filial), e Laticínios Mondaí Ltda, no município de Mondaí. Todos os denunciados são suspeitos de integrar organização criminosa hierarquizada e especializada na adulteração de leite bovino destinado ao consumo humano, bem como de praticar crimes de falsidade ideológica, crimes contra o consumidor e fraudes na criação de cooperativa. Em alguns casos, as penas sugeridas podem chegar, se somadas, a 100 anos de detenção.

Segundo a denúncia, em Lajeado Grande, os crimes começaram no início de 2013, quando a organização criminosa foi criada com a finalidade de obtenção de vantagem patrimonial e financeira em razão da adulteração realizada no leite fornecido pela Laticínios Lajeado. No mesmo ano, os proprietários da empresa arregimentaram diversos parentes, amigos, funcionários e pessoas do seu convívio para constituir de modo simulado a Cooperativa Agroindustrial e Laticínios Lajeadense - Cooper Lajeadense, a qual nunca funcionou como cooperativa de fato, mas servia para que a empresa pudesse gozar de benefícios voltados apenas às cooperativas, como, por exemplo, linhas de crédito mais baratas.

Criada a cooperativa irregular, o grupo passou a falsificar notas fiscais de produtos químicos, usados na adulteração do leite, bem como distribuir o leite a vários estados brasileiros. Em cinco meses de investigação, o Grupo de Atuação Especial no Combate ao Crime Organizado (GAECO), que nesta operação contou com a atuação de Promotores de Justiça, Policiais Civis, Policiais Militares, Auditores da Secretaria da Fazenda Estadual e fiscais do Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento (MAPA/SIF), comprovou a atuação da organização, que consistia em adicionar, indevidamente, ao leite in natura os seguintes produtos químicos: Peróxido de Hidrogênio (água  oxigenada), Citrato de Sódio, Polifosfato, Hidróxido de Sódio (Soda Cáustica) e outros, como a adição de água e soro de leite.

A organização trabalhava de maneira a evitar quaisquer eventuais perdas do produto (leite cru), utilizando substâncias não permitidas e adulterando as características naturais do alimento, a fim de que este tivesse uma maior "durabilidade" por meio de adição de estabilizantes proibidos impróprios para o consumo humano, prevenindo a ocorrência do chamado leite ácido, o qual possui sua venda proibida.

O esquema montado pelos criminosos era liderado pelos sócios-proprietários da empresa, que tinham controle final da ação dos demais envolvidos, além de serem os maiores beneficiários dos crimes. Logo abaixo deles, na escala hierárquica da organização, está o químico que detinha o conhecimento técnico para a realização da adulteração do leite cru e quem determinava e orientava os demais empregados a executarem a adição indevida de substâncias químicas no produto comercializado pelo Laticínio.

Em Mondaí, a operação de adulteração do leite era a mesma, porém ocorria há pelo menos seis anos. Dezesseis pessoas ligadas à Laticínios Mondaí Ltda foram denunciadas por integrar organização criminosa, pela prática de falsidade ideológica e por crimes contra o consumidor.

Segundo o Ministério da Agricultura, o leite recebido da empresa Mondaí é um dos piores de Santa Catarina, principalmente no que se refere à quantidade de bactérias. A carga bacteriana aceita é, no máximo 300.000 bactérias por ml de leite. Na Laticínios Mondaí, a carga traz entre entre 1,5 milhão e 2 milhões de bactérias por ml de leite. Com esta quantidade de bactéria, o leite não resistira a longas viagens. Então, a empresa adicionava produtos químicos que mascaravam a contagem de bactérias, mas de forma que seja possível a detecção pelos testes laboratoriais do MAPA.

A ação dos químicos, tanto em Mondaí como em Lajeado Grande, foi fundamental para a operação. Após a realização de vários testes, os denunciados chegaram a uma fórmula onde conseguiram adulterar e corromper as cargas de leite de forma que o crime não fosse flagrado pelos protocolos dos órgãos oficiais de fiscalização.

A investigação pelo MPSC começou após informações repassadas pelo MAPA, que indicavam prática de habitual adulteração de leite bovino nas empresas. Foi quase meio ano de investigação para que os órgãos públicos chegassem aos criminosos e reunissem as provas legais.

Além de pedir a condenação dos denunciados pelos crimes previstos em lei, o MPSC pede que todas as informações apuradas no inquérito, inclusive as sigilosas, sejam compartilhadas com os órgãos competentes da esfera do consumidor bem como as autoridades fazendárias do Estado de Santa Catarina para a adoção das medidas cabíveis em defesa do consumidor como, por exemplo, "recall" dos produtos que se encontram nos estabelecimentos comerciais. Além disso, o Ministério Público pede a manutenção das prisões preventivas de 15 denunciados para que não interfiram nas investigações.

Como era feita a adulteração do leite

Passo 1: assim que o leite chegava na empresa para ser internalizado, era realizada uma análise prévia de sua qualidade; caso estivesse dentro dos parâmetros legais, o leite era absorvido (internalizado) pela empresa e depositado em um silo refrigerado.  Caso a análise demonstrasse alguma irregularidade, o leite deveria ser descartado, sem ser aceito ou internalizado ¿ o que, porém, não vinha sendo feito pelos denunciados.

Passo 2: ao invés de descartar o leite fora dos padrões que adentrava em seu pátio, a empresa o internalizava e, para corrigir os baixos índices de qualidade do produto, indevidamente adicionava a ele substâncias químicas, principalmente citrato de sódio, peróxido de hidrogênio (água oxigenada) e hidróxido de sódio (soda cáustica).

Passo 3: depois de internalizado, o leite tinha, via de regra, duas destinações, sendo usado para a produção de queijo, na própria empresa (no caso de leite com qualidade inferior), ou então revendido para outras empresas (dentre elas a Nestlé, a Mococa, a Danone e a Shefa, as três últimas sediadas no estado de São Paulo). Quanto a estas vendas, esclarece-se ainda que, o meio de manter-se a qualidade do leite até a chegada ao destino é, ou deveria ser, a sua refrigeração e higiene, sendo regra a partida do produto na temperatura de 1.ºC (um grau Celsius).

Passo 4: o leite revendido era então carregado a partir dos silos, em caminhões com capacidade maior de carga (carga total de mais de 30.000 litros de leite), momento em que eram colhidas novas amostras e realizadas novas análises, uma vez que o leite que foi internalizado já não é mais o mesmo, por ter sido misturado com outro produto que estava nos silos anteriormente.

Passo 5:  por fim, chegando nas empresas de destino, era realizada outra análise, para aferir se o produto podia ser lá recebido. Neste ponto, o produto já estava alterado, mas com composições químicas imperceptíveis pelos protocolos oficiais. 

O MPSC apurou que a média de descarte de leite na matriz da Laticínios Lajeado em abril, maio e junho de 2014 foi de 19.500 litros por mês. Entretanto, após terem ocorrido as prisões e depois de ter sido intensificada a fiscalização pelo SIF/MAPA, em apenas 4 dias (de 19 a 22/08/2014) foram descartados 61.979 litros de leite - o que dá conta da péssima qualidade do leite regularmente internalizado pela empresa e posteriormente adulterado para então ser distribuído e vendido para o consumo humano.

Fonte: MPSC

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